9º Prêmio Nacional de Poesia – Cidade Ipatinga

Home Premiados em 2012/2013 9º Prêmio Nacional de Poesia – Cidade Ipatinga

Menção Honrosa – Suíte Nordestina
Cesar Teixeira – São Luis-MA

Réquiem do Boia Fria

Estreitando as pálpebras
acariciou a paisagem árida
e contorcida pela janela.
Num ritual silencioso
recolheu as lágrimas escassas
para fazer o último pão
com a farinha de um pesadelo.

Puxou da garganta um terço
e repartiu os Mistérios Dolorosos
com os irmãos deserdados,
esconjurando o juiz da comarca
que fabricava despejos
enquanto comia McDonald’s
com sonegação fiscal.

Era tarde – o sol se arrastava
em chamas no horizonte.
Abençoou os cinco filhos
e o cachorro indigente,
extasiado perante o milagre
da multiplicação dos ossos
e da carne reconvertida em barro.

Beijou a cruz e a esposa hirta
feito um retrato na parede.
Contabilizou faturas bancárias,
hipotecas e pecados impagáveis
e, carregando nos ombros
a ferramenta Tramontina da dor,
partiu sozinho para o infinito.

O Palco da Rosa

Primeiro espetáculo:
Big-Bang
flor vermelha
sobre o veludo negro
da língua de Deus.
Fragmentos de anjos
(orvalho),
infinitos planetas
paridos do nada.

 

 Tudo está contido
nesta rosa:
um mar de luas
e a tempestade
que varre os quintais
de Kinshasa.
É a mesma rosa
que carregamos
feito medalha,
o peito sangrando
e a morte em tijolos
construindo edifícios.

(Abre-se a cortina,
um coração partido
                    aplaude)

Lá em baixo,
o céu do avesso
mira no espelho
outra rosa:
a que canta feito pássaro
e planta raízes
nas mãos
de poetas distantes,
como veias
nos penhascos.

Ligo o lírico rádio,
mas não há som, ou voz:
a música
chega em
pétalas.

Guardanapo Recolhido nos Arquivos do Dops

O grito oprimido
do pássaro
ressoa nos guetos
da alma,
mas, ao redimir
o silêncio,
encontra a garganta
da bala
e cai dos andaimes
levando
consigo uma pátria
de flandres
para o cemitério
dos lábios.
Porém, os despojos
que ficam
conspiram no ventre
da terra,
e da cicatriz brota
um lírio
de sangue:

 

 é a primavera.

Rivoli

A vida se agita
na tela
como tatuagem
na pele
de um pássaro.
Drops:
mais uma bala
perdida
(corte estratégico)
e a cena se
apaga, sob o ruído
da vaia.

Neste filme
sem reprise
somos figurantes
(reles)
de um combate
que travamos
pela Metro
Goldwyn-Mayer.

Dormem leões
na platéia
suspirando cifras.
Nos bolsos
(em tecnicolor)
os contratos
com legendas
diminutas
de sangue e café.

A Guerra que não foi Escrita
(ou o Poema-Bomba)

 

 Todo poema é feito
de duas metades.
Uma não está na outra
como a mesma fome
em duas bocas:
a primeira produz o corte,
e a segunda
vai alinhavando a morte.

 

 Cada metade
tem seu parto soletrado
pelo alfabeto mudo
de mãos pasteurizadas
na UTI das palavras.
Há orações mutiladas
no leito de cada verso.

 

 Em todo o acampamento
já não é a dor
monossílabo abstrato.
Dizem os paramédicos
in(di)visíveis
que para um bom poema
meia palavra basta.

Nem a ONU
consegue por um fim
nessa guerra de erros
estratégicos:
um verso bombardeia a alma,
e o coração festeja
mais um suicídio.

Metades antagônicas
nos habitam solitárias.
Qual delas será a vítima
ou o carrasco?
(Arranho o peito
com uma estrela nova
e sinto queimar a mão,
que já não escreve).

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